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Brasília, DF, Brazil
Cláudia Falluh Balduino Ferreira é doutora em teoria literária e professora de literatura francesa e magrebina de expressão francesa na Universidade de Brasília. Sua pesquisa sobre a literatura árabe comunga com as fontes do sagrado, da arte, da história e da fenomenologia em busca do sentido e do conhecimento do humano.

domingo, 20 de novembro de 2011

Ainda poesia de Ben Jelloun

As filhas de Tanger.

As filhas de Tanger têm uma estrela sobre cada seio.
Cúmplices da noite e dos ventos, elas moram nas conchas sobre um rio de ternura. Vizinhas do sol que lhes sopra a manhã como uma lágrima na boca, elas têm um jardim.
Um jardim escondido na aurora, em algum lugar na velha cidade onde os contadores de história fabricam barcas para os pássaros gigantes da lenda. Elas trançaram um fio de ouro na cabeleira rebelde. Belas como a chama erguida na solidão, como o desejo que ergue as pálpebras da noite, como a mão que se abre sobre a oferenda, fruto dos mares e das areias . Elas vão à cidade aspergir a luz do dia e dar de beber aos homens suspensos nas núvens. Mas a cidade tem duas faces: uma par amar outra para trair. O corpo é um labirinto traçado pela gazela que roubou o mel dos lábios da criança. Uma echarpe lilás ou tingida amarrada sobre a fronte para preservar o escrito da noite sobre o corpo virgem. Uma flor sem nome brotou entre duas pedras. Uma flor sem nome acendeu o fogo no céu do dia ferido. Uma fenda nos lábios por onde passa a música que faz dançar os espelhos. As filhas, descidas de um pico vizinho, nuas por detrás do véu do firmamento mordem um fruto maduro. Chove cascalho sobre o véu. O véu se transforma em riacho. As filhas, sereias que fazem amor com as estrelas. As filhas de Tanger acordaram esta manhã. Tinham areia entre os seios. Sentadas em um banco da praça. Orfãs.

 In: Cicatrizes do Atlas. Brasília: Universidade de Brasília. 2003. Tradução de Cláudia Falluh.