O Grupo Literatura Magrebina Francófona homenageia a Síria,
mãe da civilização.
Se a primavera árabe foi uma
farsa que possibilitou massacres inúteis, já que Ben Ali, o
ditador da Tunísia onde tudo começou está exilado em algum harém saudita,
Khadafi foi esfolado vivo e arrastado no abrasante cascalho do deserto líbio e
do país hoje ninguém mais sabe, os monarcas marroquinos estão com as barbas de molho, a Argélia, calejada pelas enfumades
do tempo da colonização selvagem e predatória que a França lhe impôs, se recolhe
nos altiplanos das montanhas Cabila, os egípcios engaiolaram o amaldiçoado
Mubarak, morre-não-morre, (nem seu suposto pai Akénathon o quer por aquelas
paragens do além), mas a situação dos coptas continua indefinida e a etnia
oprimida, enfim, diante destes fatos o que dizer do destino da Síria e de seu
jovem ditador Bashar al-Assad nascido na fatídica data ocidental de 11 de
setembro de 1965?...
Aqui por estas bandas
ocidentais quando se fala do oriente médio todos pensam imediatamente na
situação palestina, no Hamas, no Hezbollah, no conflito com Israel que já é quase septuagenário,
no petróleo saudita, na guerra civil do Líbano, nos aiatolás e suas esquisitices
que não são árabes, são persas, assim como se fala muito sobre a
fúria dos mujahidins talibãs cujos milhares de quilômetros que deles nos
separam é uma benção, mas que também não são árabes, são afegãos, ou patchuns, e
no Iraque, que hoje cata aqui e acolá pedaços de seu antigo turbante,
fragmentos de suas babouches, farrapos
de suas túnicas brancas e costuram um país-espantalho, cuja face andrajosa causa
espécie, pois conhecemos muito pouco de seus trajes de gala escondidos pela
mídia, exímia em expor um néo-orientalismo estereotipado e burro que não
reflete além das imagens e desconhece o passado, gerando a repetição de erros
deste no presente e pelas mentalidades. Longas frases combinam com grandes
indignações. O fato é que a situação política no oriente médio é e sempre foi
complexa e as reduções da mídia a transformam em um jogo de fanáticos e
intolerantes, enquanto que a verdade destes povos transcende estas definições
errôneas e simplistas, próprias da forma esdrúxula que o mundo ocidental
descobriu para resumir o que lhe é desconhecido, logo, indiferente - Evoé,
Edward Said... -, mas de comunicação inevitável, ainda que incompleta.
É raro ouvirmos notícias do mundo
literário árabe, sobretudo o mundo das letras sírias. A língua é uma barreira
rumo ao ocidente que os escritores do Magrebe transpuseram ao adotar o francês como um tipo de
butim de guerra, segundo a excelente expressão argelina. Porém, o mundo sírio e
sua literatura hoje fremem... As bombas e o crescente avanço da violência têm
sido mais expressivos que a palavra poética, mas as brasas ardem sob as cinzas.
Onde estão os escritores sírios neste momento doloroso em que este fantástico país é
avassalado por bombas angustiosas e inclementes unidas a promessa infame de armas químicas?
Um dos seus maiores autores é Adonis,
pseudônimo de Ali Ahmed Said Esber (1930). Adonis é um dos maiores poetas
árabes da atualidade, autor de 15 volumes de poesia. Traduzido em mais de
trinta idiomas (inclusive em português, pela Cia das Letras, tradução de Michel Sleiman e apresentação de MIlton Hatoum), ele é o grande teórico do poema em prosa,
renovou profundamente através de sua prática a literatura árabe contemporânea e
acaba de receber o prestigioso Prêmio Goethe pelo conjunto de sua obra.
Adonis escreveu uma carta aberta ao presidente Bachar al-Assad, publicada no jornal libanês
As-Safir, em 14 de junho de 2011, dois meses depois da revolta tunisiana, rompendo um grande silêncio das letras sírias, conforme o historiador libanês Abbas
Baydoun que abriu uma polêmica nas colunas do mesmo jornal.
Em dez pontos Adonis convidava « o
Sr. Presidente a colocar em prática as condições e os princípios da democracia [...]
inevitável ainda que estranha ao patrimônio cultural árabe”. Ele insistia
veementemente sobre a necessidade de separar a religião da política, e também o
Estado do partido cujos objetivos foram desencaminhados ao longo do tempo.
Mais que o conteúdo desta carta, numerosos detratores de Adonis na imprensa
árabe visaram a maneira pela qual ele se dirigia ao « presidente eleito »
(Al-Assad sucedeu seu pai) assim como “depositar nele esperanças”. Em 6 de agosto
de 2011, o poeta radicalizará e convidará o presidente sírio a pedir demissão...
Adonis com sua carta aberta coloca
o dedo no nariz do dirigente em uma atitude corajosa e destemida que sua
idade avançada (81 anos) isenta de maiores males.
Entrevistando Adonis, o jornalista Mohammed Chouïeb lhe perguntou: Poderá um dirigente político ler a carta de
um poeta ou escutar seus conselhos? Ao que Adonis respondeu: Qual dirigente deixou de ouvir um poeta? (Leia
a entrevista completa em http://bibliobs.nouvelobs.com/actualites/20110928.OBS1292/adonis-il-n-y-a-pas-eu-de-revolution-arabe.html).
E a Síria segue seu destino, entre muita bomba e pouca poesia, mas com a
solidariedade daqueles que rezam pelo povo e torcem para que os tesouros da
civilização que estão guardados naquele país sejam preservados da arrogância,
da ganância e do ódio iconoclasta. Enfin,
bref...
O Grupo Literatura Magrebina Francófona é um amigo que se solidariza com a Síria, seus poetas e seu povo nestes tempos de trevas. Mas as luzes sempre vencem a escuridão.
Cláudia Falluh Balduino Ferreira.
Cláudia Falluh Balduino Ferreira.
Assista aos excelentes vídeos com Adonis no México, falando sobre literatura: "A poesia deve estar sempre ao lado do homem livre! " . Excelente entrevista. em:
Sobre o poeta e a primavera árabe. Muitíssimo bom, não perca em:http://www.youtube.com/watch?feature=player_detailpage&v=GFb_SHJwUyA
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